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Empresária, que é bolsonarista, inaugurou dois clubes e uma nova loja em cidades mineiras

Reportagem
30 de outubro de 2022
06:00
Este artigo tem mais de 1 ano

“Os proprietários são fantásticos. Loja conta com os mais variados acessórios, armas, munições”. Esse é um dos comentários de clientes satisfeitos da loja Armas & Cia, localizada no centro de Viçosa, município no sudeste de Minas Gerais. O comércio de Adriane Ferreira Gouveia Colatino, ferrenha defensora de Jair Bolsonaro nas redes sociais, recebeu uma benesse do atual governo: um financiamento de R$ 110 mil através do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O empréstimo, segundo dados do banco, aconteceu em janeiro de 2021, no meio da pandemia.

Reprodução dos detalhes do financiamento do BNDES para o comércio de Adriane Ferreira Colatino.

O problema: o financiamento é irregular. O BNDES é proibido pelo próprio regulamento de emprestar dinheiro para lojas que vendem armas. Nas palavras do próprio banco: “o BNDES não financia comércio varejista de armas para qualquer instituição. Seus normativos internos o impedem de oferecer tal modalidade de crédito”.

Reprodução de trecho do regulamento do BNDES.

“Comércio varejista de armas e munições” é justamente a descrição da atividade econômica principal da Armas & Cia, conforme dados da Receita Federal, consultados pela Agência Pública

Contudo, segundo os dados abertos do BNDES, apesar de se chamar Armas & Cia, a loja foi cadastrada na lista de financiamentos do banco como comércio varejista de artigos esportivos.

Em agosto, o BNDES já havia sido denunciado por financiamento irregular de estabelecimentos ligados a armas. Na época, reportagens denunciaram que o banco havia financiado o Clube de Tiro Keller, no Rio Grande do Sul. O financiamento ao clube, cujo dono é um major da reserva da Polícia Militar gaúcha, Ivan Keller, foi aprovado no mesmo ano do empréstimo à Armas & Cia.

Após as denúncias, o BNDES disse que o dinheiro ao clube gaúcho foi emprestado enquanto o estabelecimento “ainda estava classificado exclusivamente como ‘Atividade de Ensino de Esportes”’. Além disso, segundo o banco, depois da repercussão, o BNDES entrou em contato com o Badesul, que intermediou o empréstimo, e foi decidido que o clube de tiro deveria pagar de uma só vez a dívida com juros.

A reportagem questionou a assessoria do BNDES sobre o porquê do financiamento contra as suas próprias normas, mas não teve resposta até a publicação. Também questionamos a dona da Armas & Cia sobre os empréstimos, através dos contatos divulgados pela loja. Ainda não houve resposta.

Fachada da loja Armas & Cia.
BNDES liberou empréstimo para loja de armas; regulamento do banco proíbe

Com empréstimo, donos abriram dois clubes de tiro e loja em MG

“Parabéns por mais essa conquista. Deus continue te abençoando”, comemorou um amigo de Adriane Colatino em seu Facebook quando ela anunciou a expansão dos negócios. Em janeiro de 2021, o Clube Armas & Cia anunciou um novo clube de tiro em Ubá, município próximo a Viçosa, com mais de 100 mil habitantes. Os primeiros atiradores que se filiassem ao clube de tiro em Ubá poderiam usar o de Viçosa sem custo por um ano, segundo a propaganda.

Janeiro foi justamente o mês do financiamento do BNDES para a Armas & Cia. O empréstimo de R$ 110 mil foi intermediado pelo Banco Bradesco — coincidente, a loja em Viçosa fica ao lado de uma agência do banco. O empréstimo deve ser pago em quatro anos e nove meses, com juros de 7,5%.

Em junho, após empréstimo, a Armas & Cia anunciou a inauguração de mais um ponto em Ubá. Desta vez, uma loja de armas, tal qual já havia em Viçosa. O estabelecimento, inaugurado em julho, está localizado em uma área nobre para comércio, na região central da cidade.

Em outubro, Colatino anunciou um terceiro clube de tiro, este em Ponte Nova, município de cerca de 60 mil habitantes, também em Minas Gerais. A inauguração aconteceu em novembro.

Flyer da loja de armas ''Armas & Cia'' anunciando novo clube de tiro.
Loja de Armas recebeu empréstimo do BNDES em janeiro de 2021. No mesmo mês, grupo abriu um clube de tiro; em julho, uma segunda loja; e, em novembro, um novo clube de tiro

Apoiadora de Bolsonaro e cristã, Colatino doou R$ 10 para a campanha do presidente. Em seu Facebook, ela compartilhou postagens de apoio ao presidente e o slogan do Pró-armas, maior grupo armamentista do país, do qual participam Eduardo Bolsonaro e ex-secretários do governo, como os ex-secretários da Cultura Mário Frias e André Porciuncula.

Em setembro deste ano, ela escreveu um artigo para o jornal Folha de Ponte Nova na qual se apresenta como proprietária e despachante de armas do grupo Armas & Cia. No texto, ela critica a decisão do STF do mesmo mês que manteve a suspensão de decretos de Bolsonaro que flexibilizam a compra e porte de armas, referendando liminar do ministro Edson Fachin. “Nós, do Grupo Armas & Cia, estamos preparados, mesmo com esta situação-surpresa, para lhes informar e aumentar as chances de obter a posse de sua arma”, escreveu.

Ela é casada com o instrutor de tiro Gerson Colatino, que também faz propaganda dos negócios da família e está registrado como presidente do Clube de Tiro em Viçosa, no site da Confederação Brasileira de Tiro Prático.

A confederação lista o seu pai, Geraldo Gouveia, como vice-presidente do clube de tiro. Ele foi candidato a deputado estadual pelo PSL de Minas em 2018, na época, o partido que elegeu Bolsonaro. Apoiador do presidente, ele convocou para os atos bolsonaristas de 7 de setembro de 2021, quando Bolsonaro xingou o ministro do STF Alexandre de Moraes de “canalha” e disse que não cumpriria mais suas decisões. Colatino compartilhou a postagem do pai convocando para os atos.

Reprodução de publicação de Adriane Colatino na rede social Facebook.
Vice-presidente de clube de tiro é ex-candidato a deputado e pai da atual dona da loja de armas, segundo site da Confederação Brasileira de Tiro Prático
Reprodução
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